terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Uma criança nas mãos da rua. - Parte 3

Os passos se aproximavam, estava tudo completamente escuro. Não conseguia saber se a pessoa que entrava sabia se nós estávamos ali ou não. Tudo se silenciou durante alguns instantes. De repente uma lanterna se acendeu em meu rosto, levei um grande susto e arregalei meus olhos tentando enxergar quem era. O medo e a tensão tomou conta de todo o meu corpo, sentia o suor frio em minhas mãos, perdi o ar momentaneamente. A luz da lanterna se movimentou sobre os rostos de Jake e Lily, que também estavam muito assustados.
- Pirralhos, o que fazem aqui? - uma voz rouca e masculina disse. Eu podia sentir o hálito de cachaça. Não respondemos por puro medo. Eu sentia que Jake e Lily esperavam eu responder algo, apenas por ser mais velho e me "responsabilizar" por eles.
- Q-quem é você? - eu disse, minha voz tremia.
- Quem sou eu? Boa pergunta. Eu sou o dono dessa casa, sabia?
- Dono? - Lily disse baixo, como um miado.
- É, garota! Dono. - ele cospia as palavras.
- Estamos saindo, então. - eu confiei em minhas palavras. Não podia ficar ali com Lily e Jake.
- Epa, epa, epa! Alguém aqui disse pra vocês saírem? Acho que não... Podem ficar, mas terão que fazer uns favorzinhos pra mim.
- Nós preferimos ir embora. - Jake disse abraçando Lily. Até então eu não tinha visto o rosto do sujeito, pois ele apontava a lanterna apenas para nós três.
- VOCÊS FICAM! Hahahaha... E você, menina, vem cá. Senta aqui no meu colo.
- Não quero. - Lily disse praticamente chorando. Ela abraçava Jake cada vez mais forte, ele era seu protetor.
- Vem agora! - ele avançou nela e a puxou pelo braço.
Lily começou a chorar e gritar desesperadamente, mas eu sabia que ninguém viria nos ajudar ou salvar ali, naquela casa abandonada e no meio da madrugada. Se alguém devia fazer algo, esse alguém seria eu, o Jake estava com mais medo comparado a mim, eu era o que restava.
A lanterna estava caída no chão virada para a parede, então ninguém via o que acontecia ali. Eu só escutava Lily bater nele tentando se defender. Ela gritava "não" incontrolável e desesperadamente. Corri em direção aos fundos da casa e peguei um bom pedaço de madeira que estava jogado por lá junto a outros entulhos. Voltei para o local da cena. Tudo o que eu escutava eram: os gritos de Lily, o debater dela, o choro de Jake e meus corridos passos. Aproximei-me de Lily e do homem bêbado, pedi a Deus para que acertasse meu alvo. Juntei minhas forças e dei uma paulada na cabeça de alguém. Eu esperava que fosse na do maldito bêbado. Depois da paulada, tudo se silenciou, eu não queria ter machucado Lily. Tudo estava escuro e silencioso agora. O que havia acontecido? Nem eu sabia.

CONTINUA

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Uma criança nas mãos da rua. - Parte 2

Vi o grande carro preto indo embora rapidamente. Tenho certeza que eles ainda me procurarão, tenho que me manter escondido, mas não posso ficar em casa.
Andei pela rua durante algumas horas, procurando um bom esconderijo. Avistei uma casa com a construção não terminada, havia apenas tijolos. Ela era cercada de mato alto, por enquanto eu ficaria ali. Parecia ser um bom lugar pra um menino foragido.
Embrenhei-me no mato e entrei pelo que poderia se chamar de porta. O chão era feito de cimento, pelo menos. Andei pela casa para conhecer os cômodos e levei um grande susto: deparei-me com duas crianças menores que eu. Um menino e uma menina.
- Quem são vocês? - eles se abraçaram e se encolheram. - Não se preocupem, não vou machucá-los. - ele a soltou e levantou-se.
- Oi. - o menino disse, ele era mais velho que ela. - Sou Jake e essa é Lily. Quem é você? - eles estavam sujos.
- Sou David. Por que vocês estão aqui?
- Estamos sozinhos no mundo, nossa mãe nos abandonou.
- Ela morreu?
- Não. Ela não quis nos criar. - aquilo me deixou triste. Como uma mãe podia abandonar seus filhos do mundo? Inimaginável.
- Ah, sinto muito.
- Tudo bem. Sua mãe também te abandonou?
- Não exatamente. Ontem meus pais sofreram um acidente. Hoje o Conselho Tutelar veio me buscar, mas fugi e me escondi deles. - senti tristeza.
- Não fique triste, David. Você não é o único abandonado no mundo. Você pode ficar aqui com a gente, se quiser.
- Sim, eu quero. Mas não sei por quanto tempo, porque eles virão me procurar novamente. Tenho medo.
- Não se preocupe, ficaremos juntos. - ele estendeu sua mão esperando que eu a apertasse, então eu o fiz.
~~
Alguns dias se passaram, era difícil sobreviver ali. Sem água, sem comida. Tínhamos que pedir de casa em casa, esperando que alguém tivesse um bom coração e nos desse um prato de comida. Eu não havia tomado um banho sequer desde a morte de meus pais. Eu, Jake e Lily muitas vezes tínhamos que dividir um prato de comida ou um copo d'água. Eu não estava mais em meu bairro, pois alguém poderia me ver e avisar ao Conselho Tutelar.
Uma semana depois na nossa casa, eu me sentia magro, fraco e cansado. Tentava cuidar de Lily e Jake, pois era o mais velho.
Certa madrugada, ouvi alguns passos dentro de nossa casa. Levei um grande susto e os acordei cautelosamente. O que faríamos? Teriam invadido nossa casa?

CONTINUA

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Uma criança nas mãos da rua. - Parte 1

Era fácil ver o mundo assim. Pessoas na rua, mendigos, crianças abandonadas, todos nós estamos acostumados, inclusive eu. Eu afirmo que nunca, nunca mesmo pensei que um dia, eu pudesse passar tudo o que eles passam, viver essa realidade.
~~
Meus pais são filhos únicos, ou seja, não tenho tios nem primos, apenas meus pais. Meus avós já se foram. Meu nome é David, tenho 11 anos. Tenho poucos amigos, sou uma criança como outra. Tenho meus sonhos, um deles seria de ser médico.
Eu tinha uma vida boa, meus pais nunca deixavam faltar nada para mim. Até que um dia, aconteceu o inesperado, o que toda criança teme. Meus pais deixaram esse mundo por conta de um acidente de carro. Minha cabeça virou de cabeça pra baixo, o que eu faria? Eu era apenas uma criança e agora, eu estava sozinho no mundo. Meu mundo desmoronou.
Recebi a notícia por um telefonema da polícia, eu estava sozinho em casa. O conselho tutelar viria me buscar no dia seguinte.
~~
Bateram na porta, fui abrir e me deparei com algumas pessoas de terno.
- Oi. Você deve ser o David. Podemos entrar?
- O que vocês querem? - eu estava com os olhos inchados, pois não havia dormido na noite anterior de medo e tristeza.
- Nós te explicaremos tudo. Podemos?
- Tá bom, entrem.
Eles entraram e se aconchegaram no sofá, fiz o mesmo.
- David, nós somos do Conselho Tutelar. Você virá conosco e terá onde dormir, comer, estudar e terá amigos. Agora que está sozinho, não teria como pagar tudo o que seus pais te davam e além de tudo, você é menor de idade, não pode ficar sem responsável. - eu escutava tudo de cabeça baixa. - Você tem algum tio, algum parente?
- Não. - uma lágrima escorreu de meus pequenos olhos.
- Muito bem, então você virá conosco.
- Mas e a minha casa? E as coisas dos meus pais?
- Daremos um jeito.
Eu não queria ir com eles, não mesmo! Eu queria meus pais, mas eles não estavam mais aqui. Teria que me virar sozinho pra não ficar nas mãos dessas pessoas sem coração.
- Venha, David. - eles estavam na porta de minha casa me esperando.
Levantei do sofá e segui em direção a eles. Caminhávamos em direção a um carro preto. Eu não podia acreditar que isso estava acontecendo comigo, justo comigo. Sempre fui um bom filho, uma boa criança. Não terei esse fim. Resolvi correr, foi a primeira ideia que veio á minha cabeça para não ter que ir com eles. Corri com toda força que podia.
- Peguem ele!
Dois seguranças correram atrás de mim, mas eu era pequeno e poderia me esconder fácil, foi o que fiz. Virei a esquina e entrei num jardim de uma vizinha, eles passaram direto. E agora, o que eu faço?

CONTINUA

Descobrindo minha doença. - Final

Outubro, 2010
Cheguei ao show com Sophia. Estava bem cheio e agitado. Encontramos parte da galera lá, eu me enturmava aos poucos. Alguns ainda me olhavam torto, mas eu já havia acostumado e eles acostumariam comigo também, eu acho.
~~
- Oi, meu nome é Jack. E o seu? - o sorriso dele era perfeito.
- Julie. - sorri timidamente.
- Quer dançar comigo?
- Sim. - virei-me para avisar á minha amiga. - Sophia, vou ali um instante, ok?
- Ok. - ela continuou dançando com a galera.
Jack era da minha escola, mas não da minha sala. Eu nunca tinha reparado nele e acho que nem ele em mim. Nos misturamos no meio da multidão e começamos a dançar. Eu me sentia o mais livre possível. Há muito tempo eu não me sentia assim, muito mesmo.
Ele me puxou pela cintura colando nossos corpos, estávamos ofegantes. Olhou no fundo dos meus olhos, o espelho de minha alma e tocou seus lábios macios nos meus. Eu nunca esqueceria esse dia.

Novembro, 2010
Estávamos todos em minha casa na mesa de jantar. Eu estava feliz, minha família e a do Jack unidas ali. Ele se levantou e olhou para mim:
- Eu gostaria de pedir formalmente agora, já que todos estão aqui. Julie, nesse último mês, você entrou em minha vida rapidamente e já não imagino você fora dela. Eu te amo, você aceita namorar comigo?
- Siiim! - o abracei.
Aquilo pra mim era surreal. Eu venci minha doença, venci. E além disso, arranjei amigos e agora, um namorado. Minha vida era perfeita agora e eu estava mais feliz do que nunca.

Abril, 2011
- E, por fim, eu gostaria de dizer a todas as meninas que nunca percam a confiança em si mesmas. O melhor apoio é o dos pais e dos amigos, sem isso, não somos ninguém. Acreditem em vocês mesmas, sempre.
Eu havia acabado de dar a minha nona palestra para um grupo de garotas. Isso era o mínimo que eu podia fazer, passar pra elas tudo o que eu passei e mostrar o melhor caminho. A cura de uma doença, como a anorexia ou bulimia, é algo muito difícil que exige esforço e confiança do doente e apoio de todos á sua volta. Eu acreditei, eu me curei.

FIM

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Descobrindo minha doença. - Parte 7

Agosto, 2010
Anorexia. Uma doença incontrolável. Minha vida dependia de meus pais. Apesar do início do meu progresso, eu devia continuar confiante até atingir a minha cura.
~~
- Oi.
- Oi.
- Meu nome é Sophia. E o seu?
- Julie, prazer.
E ali foi o começo de uma grande amizade, dentro de uma sala de aula. Ela era diferente dos outros, eu nunca imaginaria isso.
~~
- Mãe, essa é a Sophia.
- Oi, Sophia. - ela sorriu.
Depois de um dia em minha casa, Sophia foi embora. Minha mãe veio conversar comigo.
- Julie, você arranjou uma amiga. - ela sorriu e me abraçou.
Era ruim lembrar de quando eu não tinha ninguém e ficava dias e dias sozinha em casa, sem comer, sem viver.

Setembro, 2010
- 45 quilos. Graças a vocês, meus pais. - eles sorriram.
Eu estava recuperando meu peso, isso era uma grande superação. Sempre quando eu me olhava no espelho, ainda tinha a impressão de que eu estava gorda, mas eu tentava esquecer, porque sabia que era apenas uma ilusão. Continuava confiante, eu estava perto da cura.
~~
- Julie, quer ir num show com o resto da galera?
- Num show, Sophia? Ai, não sei... Você sabe como isso é difícil pra mim.
- Mas pensa só, você já chegou até aqui, pra você agora o resto será fácil. Acredite em você.
- Tá bem, vou falar com a minha mãe. - ela comemorou e me abraçou.

CONTINUA.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Descobrindo minha doença - Parte 6

Julho, 2010
Férias. Meus pais estavam todos os dias comigo. Eles controlavam minhas refeições cautelosamente. Ás vezes, por mais que eu tentasse me impedir, eu vomitava. Por querer ou espontaneamente. Eu caía várias vezes, tropeçava fácil, tudo por causa da fraqueza. Muitas vezes o pensamento que a morte estava perto me invadia.
~~
- Mãe, vamos ao shopping? Tô afim de me distrair um pouco.
- Vamos sim. - ela sorriu e continuou arrumando a pilha de roupas sobre a cama.
A imagem se embaçou e escureceu diante de meus olhos. Eu senti uma forte tontura e me sentei com a mão na cabeça.
- Que foi, Julie? - senti nervosismo na voz dela.
- Eu tô tonta. - não vi nem ouvi mais nada.
~~
- Senhora, inclua essas vitaminas nas refeições da Julie. - ouvi ao fundo.
- Claro, pode deixar.
Abri meus olhos e me deparei com uma sala branca. Eu estava deitada e sentia um pouco de dor de cabeça.
- Mãe? - disse fracamente.
- Filha, você está bem? - ela e o médico vieram até mim rapidamente.
- Sinto um pouco de dor. O que aconteceu?
- Sua pressão baixou demais e você desmaiou.
Foi aí que me dei conta que estava com agulhas em meu braço. Depois de dois dias no hospital, voltei pra casa.
~~
Minha mãe trabalhava apenas um turno e deixava o resto do dia para cuidar de mim. Durante esse turno, meu pai estava em casa. Eles nunca me deixavam sozinha, apenas para dormir.
Minha mãe cuidava da minha alimentação como minha vida, e eu já não vomitava mais. Com o apoio familiar, eu me sentia muito mais amada e eu havia encontrado minha confiança.
~~
Agosto, 2010
A volta ás aulas. No primeiro dia de aula, tirei uma dúvida com o professor. Aquilo foi um ótimo progresso para mim. Estava feliz por ter conseguido.
Cheguei em casa sorrindo e contei a minha mãe o que havia feito. Ela ficou superorgulhosa.
- Filha, meus parabéns! Você é uma menina forte.
- Obrigada.
- Trouxe uma coisa. - fiquei curiosa. - Uma balança. Controlaremos seu peso sempre. E sem deixar as consultas de lado.
- Claro, mãe. - sorri. - Vamos estrear?
- Sim, suba.
- 42 quilos! AI, MEU DEUS, MÃE! - gritei de alegria e a abracei.
- Filha, você conseguiu 3 quilos, meus parabéns!
Eu nunca esqueci daquele dia. Ele representou o não só o início de uma nova vida, mas também que eu tinha o poder de me curar. Basta encontrar a confiança.

CONTINUA.

Descobrindo minha doença. - Parte 5

Se eu não dissesse, eu continuaria dessa forma, emagrecendo. E talvez conseguisse minha carreira de modelo. Mas eu não estava feliz. Eu estava acabada e o mundo parecia estar fechado pra mim. Por quê?
~~
- Não está acontecendo nada, eu já disse, doutor.
- Julie, eu só te perguntei, pra ver se você respondia. Na verdade, você está muito doente, e eu sei o que você anda fazendo.
- Não! Eu não estou doente.
- Você está com anorexia nervosa e também bulimia.
Minha mãe caiu no choro, ela se desesperou incontrolavelmente. Eu, sem saber que estava doente, também chorei. E muito. Pra mim, eu estava apenas cuidando do meu corpo da minha maneira. Mesmo sofrendo muitos sintomas ruins, eu não parava com isso. Era uma obsessão querer ter um corpo perfeito.
- Julie, preste atenção: você será encaminhada para o psicólogo, mas também continuará tendo consultas comigo. Você quer sair dessa?
- Eu quero emagrecer, ser modelo, ser linda. - eu sorria enquanto minhas lágrimas ainda caíam. - Esse é meu sonho.
- Mas você precisa entender que você é linda do seu jeito. E não precisa parar de comer, ou vomitar suas refeições para emagrecer. Você pode seguir sua carreira, mas sem essa obsessão. E também precisará do apoio familiar.
- Doutor, olhe para mim. Eu estou gorda!
- Minha filha, você não está gorda. Ao contrário, você está muito abaixo do peso.
- Vocês só podem ser cegos!
~~
Minhas consultas foram marcadas. Além do médico, eu também teria consultas com psicólogos. Eu não preciso disso. Eu estou bem. A culpa é do mundo, das pessoas.

Julho, 2010
Minha primeira consulta no psicólogo. Apenas minha mãe foi comigo.
- Boa tarde, Julie.
- Boa tarde.
- Então, o que você tem?
- O médico disse que estou com anorexia e bulimia. - eu estava triste, como sempre.
- E você acha o que disso?
- Na verdade, eu nem sabia que estava doente. Vou dizer a verdade: eu não comia quase nada. Eu queria emagrecer para ser modelo. Ter um corpo perfeito.
- Você sabia que nem todo corpo perfeito precisa ser magro?
- Mas pra ser modelo, deve ser assim.
- Julie, em primeiro lugar, vem a saúde. Como você se sente depois que começou a fazer isso?
- Tudo é muito ruim. Eu tenho insônia, falta de apetite, fraqueza, tristeza e muito mais.
- O que seus amigos dizem disso?
- Eu não tenho amigos. Na minha nova escola, ninguém se aproxima de mim. Os amigos que eu tinha, se afastaram.
- Será que eles mesmos se afastaram? Ou foi você? - eu nunca pensei dessa forma. - Você também deve ter se afastado deles.
- Sim, eu me afastei. Nunca havia reparado. Para mim, a culpa era deles.
- E por que você não tem amigos nessa nova escola?
- Sinto medo de fazer amizades. Eles riem de mim, zombam, me observam. Ás vezes sinto medo deles. Eles parecem ser todos iguais.
- Julie, ninguém é igual no mundo. Há várias pessoas com o coração aberto para uma amizade.
- Na minha escola é impossível.
- Nada é impossível. Você precisa acreditar em você e ter sua autoconfiança. Você precisa arriscar mais.
Aquelas palavras me fizeram acordar para o mundo. Tudo o que ela disse era verdade. Eu não posso pensar algo sem antes ter certeza, sem antes verificar. Eu preciso me curar, não quero que pensem que sou uma doente. Eu vou me curar.

CONTINUA.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Descobrindo minha doença. - Parte 4

Abril, 2010
Essa tinha sido a melhor solução que eu já tomei esse ano. Se eu diminuir minha alimentação, eu vou emagrecer, óbvio! Então foi o que eu fiz. Como meus pais não ficavam em casa, eu comia pouquíssimo. Nos fins de semana, quando eu estava com eles, eu comia um pouco mais, apenas pra disfarçar. Nos dias de semana, eu comia no máximo uma fruta por dia. Ás vezes eu não comia nada o dia inteiro, apenas bebia um copo d'água, ou não.

Maio, 2010
Minha mãe não me dava atenção devido ao trabalho, nem meu pai. Eu já não conversava com ninguém, guardava meus pensamentos e desejos para mim mesma. A escola era uma tortura diária. Eu passava os intervalos na sala de aula lendo. Eu estava emagrecendo, podia sentir.
~~
Todos os dias eu me olhava em frente ao espelho esperando ver um corpo perfeito, mas tudo o que eu via era alguém acima do peso, uma gorda! Eu estava com 40 quilos e usava roupas largas pra disfarçar, principalmente na frente de meus pais.

Junho, 2010
- Julie, venha aqui. - era um sábado.
- Fala, mãe.
- Vire-se de costas. - fiz com um pouco de medo.
- O que você anda comendo??
- Err, eu como normal. Comida, almoço, janta.
- Julie, vamos ao médico agora.
- O QUÊ?
~~
- Julie, o que você anda comendo? - o médico perguntou o mesmo que minha mãe.
- Eu faço refeições diárias. Como todo mundo. - menti.
- Vamos fazer uma endoscopia.
- Quando? - eu estava com medo de me descobrirem.
- Agora mesmo. Vamos.
Entramos em outra sala. Ele pediu pra eu me sentar e relaxar.
- Essa endoscopia se chama de gastrointestinal. Descerei o endoscópio pela sua garganta até chegar no estômago. Fique quieta, por favor. - eu não podia impedí-lo, minha mãe estava ali.
Ao terminar, eu estava um pouco tonta, porque ele havia me dado um remédio não sei para quê.
- Olha, Senhora, o estômago de sua filha não anda nada bem. Acho que ela não anda se alimentando corretamente. Vamos medir o peso.
Subi na balança e o médico se assustou.
- Julie, você está com 39 quilos!!
- O QUÊ? - minha mãe disse. - Como eu não percebi isso?
- Julie, por favor, estamos aqui e queremos seu melhor, por favor, nos diga a verdade e te ajudaremos também. O que anda acontecendo com você?
Deveria falar?

CONTINUA.

Descobrindo minha doença. - Parte 3

Fevereiro, 2010
Primeiro dia de aula, numa nova escola. Estou com medo e um pouco nervosa, mas tomara que dê tudo certo. O sinal bateu e entrei em minha sala. Niguém falou comigo, eu também não ousei falar com ninguém.
Uma semana se passou e eu não tinha falado com nenhum aluno e nenhum professor, eu me sentia invisível. Algumas pessoas riam de mim, não sei o motivo, mas eu sentia muitos olhares quando chegava perto dos grupos. Eu preferia tentar não ouví-los.
Certo dia, numa aula de Educação Física, levei uma bolada forte na barriga e caí no chão sentada. Isso foi motivo para todos rirem e zombarem de mim, aquilo acabava comigo, eu ficava muito triste. Eles gritavam "Fraca, fraca!", e eu sentia raiva e vergonha de todos.
Todo esse bullying me fazia pensar que todas as pessoas de minha escola eram dessa maneira. Não me aceitavam, não gostavam de mim. Eu também não ligaria pra eles, afinal de contas, quem gostaria de ter amizade com esses idiotas? Eu não.

Março, 2010
Eu sentia insônia, cansaço, medo de tudo e de todos. Não tinha apetite e estava sempre pálida. Não tinha amigos, meus pais trabalhavam o dia inteiro e eu ficava sozinha. Minha vida se tornou um inferno.

Abril, 2010
Sinceramente, eu não sei o que ainda me faz estudar, ficar nessa escola idiota, onde só tem alunos limitados, não sabem o que é amizade. Ano passado sim, eu tinha mais amigos, mas eles se afastaram, infelizmente. Sinto que estou feia, gorda. Parece que a cada dia que passa, eu engordo mais.
~~
Depois de almoçar sozinha mais uma vez, fui ao banheiro e me olhei no espelho. Meu braço estava grande, minhas pernas, minha barriga. Sim, eu estou gorda. Tive uma ideia! Peguei minha escova de dentes e vomitei tudo na privada. Bem melhor, agora não vou ter o que digerir e não vou engordar mais por esse almoço. Não comi mais nada hoje.

CONTINUA

Descobrindo minha doença. - Parte 2

Fevereiro, 2010
Emagreci dois quilos, que bom! Agora estava com 44. Acho que procurarei alguma agência de modelo, escondido dos meus pais, óbvio. Eles não podem saber, ou então não deixarão eu ir.
~~
- Em que posso ajudar?
- Eu vim fazer um teste. Quero ser modelo.
- Hum, sim. Preencha essa ficha, por favor.
- Pronto.
- Precisa da assinatura dos seus pais, querida. Menores de 18 não podem entrar na agência sem autorização.
Droga! E agora?
- Eu poderia entrar apenas pra ver como é?
- Claro, Carla te acompanhará.
Entramos. Eu via pessoas de todas as idades, mas tinha uma parte apenas de meninas adolescentes, como eu. E como elas eram lindas! Um dia estarei ali no lugar delas.
Um dos homens que as arrumava, veio até mim, dizendo:
- Boa tarde. O que você faz aqui? - ele era gay.
- Eu quaro participar, mas como eu preciso da assinatura dos meus pais, essa moça me trouxe aqui pra ver como é.
- E você quer ser modelo?
- É mais que um sonho! Um dia eu serei, sim.
- Você não acha que está um pouco gorda pra isso?
Gorda? Eu? Quem ele pensa que é pra falar assim? Ele é o avaliador, ele cuida das modelos e de suas formas, é.
- Mas, você acha que eu preciso emagrecer?
- Querida, olhe para as minhas modelos. Você se parece com elas?
- N-não. Mas vou parecer, você ainda irá me contratar.
- Boa sorte.
Saí de lá o mais rápido possível. Fui para conseguir uma vaga, não para ser insultada na frente de todos.
~~
- Julie, onde você estava?
- Na casa de uma amiga, mãe.
Fui para meu quarto e me olhei no espelho. Pensando bem, eu estava gorda sim. Olha só o tamanho da minha barriga!! Isso não pode continuar assim, não mesmo.

CONTINUA.

Descobrindo minha doença.

Oi, meu nome é Julie. Estou no primeiro ano do ensino médio, tenho 15 anos e meu sonho é ser modelo. Meus pais, como sempre, não aceitam muito essa ideia, mas eu faria de tudo para ver esse sonho realizado.

Março, 2003
- Filha, você não acha que está um pouco acima do peso?
- Sim, eu acho, mãe. Mas eu só tenho 8 anos. Ainda tenho tempo pra emagrecer e virar modelo.
- Modelo, Julie? Me poupe, isso não serve pra você.
Odeio quando minha mãe fala assim comigo. Ela me põe pra baixo. Eu tenho um sonho e vou conseguir alcançá-lo. Não importa o que os outros digam.

Agosto, 2008
- Fiu, fiu.
- Que que foi, moleque? - meu pai se estressava quando algum menino mexia comigo. Mas eu tenho 13 anos, isso é normal.
Enfim, eu não estava mais acima do peso. Ia pra natação três vezes por semana e estava em forma, cinquenta quilos. Eu não era magra, mas podia ver meus músculos desenvolvidos pela natação, não muito, mas pra minha idade estava ótimo.

Setembro, 2009
Ano que vem eu começo o ensino médio. Parei de fazer natação, desanimei. Meu objetivo não era ter músculos e sim ter um corpo de modelo. Sempre entrava em sites, via fotos, roupas, desfiles, tudo. Aquilo tudo era mais que um sonho pra mim. Eu queria ser famosa, conhecida pelo mundo, queria exercer a profissão dos sonhos e ser bem sucedida. Acho que muitas meninas sonham isso, mas eu vou realizá-lo, nem que seja contra a vontade dos meus pais.

Janeiro, 2010
- Filha, vou te levar ao médico.
- Por que, mãe? Não me sinto mal.
- Você está abatida. Também não fez mais nenhum exercício depois que parou com a natação. Você precisa se cuidar mais, filha.

Duas semanas depois.
- Muito bem, senhorita Julie. - o médico dizia depois de me examinar e me medir. - Você está com 46 quilos. Isso é pouco pra sua idade, você é alta.
- Não, doutor. Pra mim está ótimo assim.
- Ela quer seguir a carreira de modelo. - minha mãe se intrometeu na conversa.

CONTINUA.

Controle sobre todos, exceto sobre mim.

- Emily, o que você faria se você perdesse tudo, inclusive a sua alma?
- Eu acho que minha existência acabaria no mesmo momento. Não sou nada sem os que me cercam, sem a luz do dia, sem a esperança da vida.
- Mas e se você tivesse apenas o poder de controlar o amor do universo?

Não respondi ao Toby. Preferi ficar calada e refletir sobre o assunto. Imagina só se eu, Emily, pudesse controlar o amor universal. Eu poderia conseguir tudo o que quisesse. Poderia matar, poderia ter tudo materialmente, poderia escolher pessoas, dizer o que quiser, machucar. Fazer tudo de bom ou de ruim, pra eles não faria diferença, porque eles me amariam eternamente. Mas e eu? Emily? O meu amor eu não controlaria. E se eu não amasse ninguém? De que adiantaria se todos me amassem, se eu tivesse tudo aos meus pés e eu não pudesse sentir o tão puro sentimento? Seria o mesmo que a morte. A ausência de vida. Sem o amor, nada sobrevive, a não ser a dor, a escuridão, a solidão. Essas não precisam de amor.

-Toby, acho que seria o mesmo que perder minha alma.

Chegando no blog.

Desejo boas vindas a todos que visitarem minha página. Pretendo escrever pequenos contos fictícios e histórias com temas variados. Comentem opinando, espero que gostem. Boa leitura.

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